Sexta-feira, 26 Abril

«The Young and Prodigious T.S. Spivet» (O Jovem Prodígio T.S. Spivet) por Hugo Gomes

Depois da, segundo o realizador Jean-Pierre Jeunet, fracassada experiência que fora Micmacs, O Jovem Prodígio T.S. Spivet é a solução encontrada para um abandono provisório ao visual excêntrico pelo qual o autor é reconhecido.

Continuando a envolver-se numa narrativa sintética e num olhar múltiplo e por vezes literário das suas personagens e respetivos pensamentos, algo comparado com o que havia feito em Amélie, eis que surge-nos a história de um rapaz de dez anos, o T.S. Spivet do título, um prodígio aspirante a cientista que conseguiu criar o inimaginável: uma máquina de movimento perpetuo, um sonho vivido e nunca concretizado pela Humanidade durante os anos da sua existência. Como prova de gratidão por este engenho, Spivet é galardoado com o prestigiado prémio Baird e para recebê-lo pessoalmente o nosso protagonista terá que secretamente “sair” da sua casa no Montana e ir até o museu Smithsonian, em Washington DC.

Uma viagem de costa a costa que traduz os códigos mais que vencidos do “coming-to-age“, uma premissa vulgar às grelhas televisivas dos nosso domingos, onde o toque de Jeunet atribui uma diferença relevante, injetando toda esta aventura com a sua mais determinante marca autoral, mesmo sob algumas limitações. Baseado no livro de Reif Larsen, O Jovem Prodígio T.S. Spivet não é só uma “trip” alicerçada na ingenuidade disfarçada, mas sim uma obra capaz de encontrar a sua própria emancipação narrativa, isso se fecharmos os olhos a tudo aquilo que havia sido antes criado por Jeunet. Contudo, é de louvar uma fita inspiradora que reflete um certo classicismo perdido deste género, envolvendo-se por lugares-comuns abandonados mas acentuados por uma força revitalizadora, ao mesmo tempo nostálgica, para com o “dialeto” mais primitivo do chamado cinema “crowd pleaser“.

Também como vetor de força da sua narrativa temos o desempenho de Kyle Catlett (que tão desperdiçado fora no recente remake de Poltergeist), o qual veste a pele de T.S Spivet com tudo aquilo que o determina: uma pitada de inocente genialidade em conformidade com uma emoção quebradiça e sempre calorosa. A personagem anexa um mundo de maneirismos e de contornos caricaturais que por vezes tornam o espectador em mais um membro da sua estranha, mas singular, família.

Constantemente onírico e fiel à matéria-prima literária, visto que Jeunet respeita as suas ilustrações, convertendo-as em dispositivos em três dimensões que salientam a visualização (em Portugal, o filme será apenas apresentado em formato 2D), O Jovem Prodígio T.S. Spivet, poderá não ser relembrado num futuro próximo, mas dita-nos com os quase perdidos moldes clássicos do cinema destinado a famílias, manuseando uma ingenuidade que parece hoje industrializada pela dominância da Disney. Por fim, vale a pena Helena Bonham Carter, a sujeitar-se a outra pitoresca realidade, longe dos olhares do seu ex-companheiro, Tim Burton.

O melhor – Kyle Catlett e a alegoria visual e narrativa de Jeunet (sob limitações!)
O pior – infelizmente não será algo que facilmente ficará na memória. O terreno trabalhado por Jeunet é fértil, mas pouco usufruído.


Hugo Gomes

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