Sexta-feira, 19 Abril

«Beyond the Reach» (À Prova de Fogo) por Hugo Gomes

Adaptado de um livro da autoria de Robb White, o thriller Á Prova de Fogo é um daqueles filmes que adquire outra dimensão devido às coincidências da sua respetiva estreia. Em Portugal, o trabalho mais notável do ainda em ascensão Jean-Baptiste Léonetti chega às salas numa semana em que o caso do leão Cecil atinge um auge de mediatismo. Segundo os media, o animal, que era considerado um símbolo do Zimbabué e integrado num programa cientifico de pesquisa, foi assassinado por um dentista norte-americano que, para o fazer, supostamente subornou os guias do parque onde o felino residia. No filme de Léonetti, Michael Douglas é um milionário, dono de uma empresa multinacional, que faz exatamente o mesmo – neste caso para ter acesso às áreas mais virgens do deserto de Mojave e assim ter hipótese de caçar um cobiçado animal.

Este não é, no entanto, o assunto da obra, mas sim uma exposição dos tiques psicóticos que o poder, económico ou social, manifesta. Jeremy Irvine transforma-se na sua presa, uma vítima à mercê da sua aptidão de sobrevivência e da natural astúcia.

Um confronto que se adivinha desigual, tendo a tendência de se transformar numa dicotomia tecnologia / instinto. É possível enquadra-lo no panorama militar, onde as forças armadas norte-americanas parecem cada vez mais dependentes da sofisticação tecnológica, procurando constantemente novas formas de luta que traduzam uma indiscutível soberania em batalha, não importando sendo ela desigual ou desumana, ou simplesmente não corresponder às leis de Genebra.

Militarmente falando, é como comparar as tropas portuguesas com o exército dos EUA, onde o equipamento parece fazer a diferença mas não a aptidão dos homens que os manuseiam. Enquanto uns são ensinados aos upgrades tecnológicos e como submete-los em pleno combate, outros como, é o caso das forças especiais lusitanas, são treinados para sobreviver e “desenrascar” em situações-limite, sem acesso a outros recursos. Num mundo apocalíptico, aludido nas paisagens do deserto Mojave, é fácil identificar o triunfante. Infelizmente, o filme não está para essas “coisas”, nem para enredos demasiado complexos, mas sim para um registo mais moralizador e subjetivo.

À Prova de Fogo possui diversos pontos a seu favor, até mesmo os seus toques variantes de A Sombra do Caçador, de Charles Laughton e dos thrillers de sobrevivência dos anos 70 (como Um Assassino pelas Costas ou Fim-de-Semana Alucinante) que o resgatam-no da habitual “enxugada” série B que se adivinhava ser. E Michael Douglas aguenta a pedalada, ao contrário de Jeremy Irvine.

O melhor – Michael Douglas e o esforço de Jean-Baptiste Léonetti
O pior – Jeremy Irvine e todo o seu conceito moralista / romântico


Hugo Gomes

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