O argentino Lisandro Alonso familiarizou-nos com um cinema de deriva, de um certo prazer no percurso que parece relativizar o propósito que o move e até mesmo o próprio destino. Foi assim em La Libertad, de 2001, e Los Muertos, de 2004. E é também o que sucede em Jauja, vencedor do prémio FIPRESCI, em Cannes do ano passado. É assim a personagem de Viggo Mortensen, um engenheiro do século XIX em busca da filha de 15 anos (a dinamarquesa estreante Viiliborg Mallin Agger) numa zona pantanosa das pampas da Patagónia, aparentemente fugida com um miliar com quem teve um momento romântico.

A estética e o propósito do soldado isolado contra os elementos traz-nos à memória Aguirre, a Cólera de Deus, de Herzog, com um Klaus Kinski imenso, também dominado pela natureza, e também aqui em busca de um pretenso El Dorado, num guião de 20 páginas escrito por Lisandro em parceria com Fabian Casas. Parte dos créditos do filme acabam por ser repartidos pelo diretor de fotografia de Aki Kaurismaki, Timo Salminen, de cores saturadas e um curioso formato 4:3 de contornos arredondados, como que a acentuar esse formato de época. Durante a conferencia de imprensa, Alonso admitiu que pretendeu aventurar-se em novos territórios, após “ter encontrado respostas às questões que procurara dos quatro filmes anteriores”.

Jauja tem sido comparado ao western mítico de John Ford, A Desaparecida, embora um filme que Alonso assumiu desconhecer. Pouco importa se é verdade ou não, mas é inegável o perfil de westen em que emerge a enorme presença de Mortensen, aqui em contraste com a utilização habitual de não atores. Aliás, Viggo foi um dos motores do projeto, ele que produziu, assinou a banda sonora e “viajou milhares de quilómetros a promover o filme”, esclareceu o realizador. Uma coisa é certa, Jauja assume o seu lado absurdo com galhardia, com um final que apenas serve para abrir ainda mais o leque de possibilidades. Como se coubesse a cada um dos espetadores fazer o seu próprio filme.

Pontuação Geral
Paulo Portugal
jauja-por-paulo-portugalÉ inegável o perfil de westen em que emerge a enorme presença de Mortensen