Um produto bem embrulhado, este Carol, a história de um amor lésbico em plenos EUA nos anos 50, salienta a força de Todd Haynes em estruturar narrativas centradas nessa época de constrangimento sexual. Pois bem, muito antes dos anos 60, e de ter surgido a transição para a revolução ideológica, social e sexual em terras do Tio Sam, os anos 50 foram considerados um limbo, onde as “causas morais” e os valores tradicionais familiares, sustentados por uma nação erguida sob doutrinas cristãs conservadoras, prevaleciam perante a vontade individual.

Todd Haynes já havia pegado nesse cenário e incutindo um revoltoso escape em 2002, com Longe do Paraíso, onde Julianne Moore interpretaria uma “perfeita” dona de casa, modelar e servente ao senso comum do protótipo familiar, que faz algo impensável: comete adultério. E fá-lo da forma mais radical e controversa para a época. Nesse mesmo ano, a mesma atriz voltaria a regressar à década, e curiosamente perdida de amores por uma mulher (As Horas, Stephen Daldry).

Por outras palavras, Cate Blanchett percorre território de Julianne Moore, mas prevalece como uma personagem própria. Ela é a Carol do título, uma mulher com uma força descomunal, mas intrinsecamente frágil perante a natureza do seu coração. A atriz opera como o motor de arranque do filme de Haynes, uma obra que situa-se algures entre a produção conservadora digna dos grandes estúdios e a ousadia quase libertina de uma produção independente.

Carol (o filme) incute diversos ares de A Vida de Adèle, de Abdellatif Kechiche, principalmente através de Rooney Mara, a perpetuar a “boneca” sexualmente e objetivamente confusa mas em constante desenvolvimento e com a autoestima em crescendo. Contudo, a atriz não é par para uma Cate Blanchett realmente profunda e carismática em todo este retrato.

Mas este Carol reserva ainda outro problema. É demasiado dependente da sua atriz e da convicção dramática entregue pela sua bem construída personagem. O resto é uma cenografia bem apresentável por parte de Haynes, de quem após o pouco convencional biopic de Bob Dylan, I’m Not There – Não Estou Aí (filme que conserva um dos desempenhos mais insólitos de Blanchett), se esperava algo absolutamente mais criativo e fora dos parâmetros do “belo embrulho” deste filme de estúdio.

Se A Vida de Adèle e Longe do Paraíso tivessem uma filha, certamente seria Carol.

Pontuação Geral
Hugo Gomes
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André Gonçalves
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