No filme de teor fantástico Society, da autoria de Bryan Yuzna, a alta-sociedade é descrita, sob um jeito metafórico e propício à crítica social, como uma comunidade de “monstros” consanguíneos, regidos por um sistema de constantes rituais de integração e de vanglória pelos excessos. Provavelmente, pouco ou nada tem de relacionado com a nova obra de David Cronenberg, Mapas para as Estrelas, o qual se baseia num livro escrito por Bruce Wagner (Dead Stars).
O realizador canadiano desgarrou-se há anos do ramo do “body horror“, o qual é constantemente mencionado e por isso comparado com a sua segunda fase cinematográfica – a da densidade psicológica. Nesta sua nova e chamada terceira fase, Cronenberg aventura-se na crítica social, com isso adaptando para o grande ecrã os mais difíceis livros contextualizados à sua missão (como foi o caso de Cosmopolis). Para as más-línguas, esta é a fase da sua parceria com o jovem ator Robert Pattinson, que após fazer suspirar milhões de fãs tenta agora alcançar um estatuto divergente da de pop star.
Mas não divaguemos por, até estabelecer o porquê da ligação entre Society e este Mapa para as Estrelas. A razão é que o sentimento de repugnação, ilustrado de forma criativa na obra de Yuzna, é insuportavelmente presente em todo o fio condutor deste “penetrar” nos bastidores de Hollywood. Porém, como em diversas obras teorizadas, a crítica não se encontra na indústria em si, mas nas personalidades que a fazem movimentar. Cronenberg trabalha com verdadeiros “monstros consanguíneos”, cujos temas da paranóia, egos, famas e incesto são inúmeras vezes mencionados numa obra drasticamente seca e despida de qualquer embelezamento. Aliás, empatia é o que falta neste bando de personagens desprezíveis e assombradas por espectros vingativos e “faustianos”.
Julianne Moore lidera – com magnificência e distinção (é a protagonista de uma das sequências mais singulares do cinema norte-americano atual) – um elenco suportável mas sem surpresas nem grandes destaques. , é curioso evidenciar que as limitações de Pattinson resultam de forma simbiótica com a seu personagem, um motorista de limusinas (ironia “arrancada” de Cosmopolis) que aspira ser ator.
Mapa para as Estrelas, mesmo assim, apresenta um Cronenberg menor que o habitual (falta sobretudo estética). É um filme de propósitos estabelecidos e de objetivos sujos que marca uma presença corrosiva. A crítica é diversas vezes relembrada e nunca poupada, que o diga o espectador, condenado à mercê de um mundo asqueroso, sonhado mas não contemplado. As “chamas” envolvem Hollywood como um dos novos círculos do Inferno de Dante.