Sexta-feira, 29 Março

«O Velho do Restelo» por Duarte Mata

Inevitável não pensar em O Velho do Restelo como o filme testamento de quem é, por excelência, o maior colosso cinematográfico português: Manoel de Oliveira. Passado num pequeno banco de jardim, Dom Quixote, Luís de Camões, Teixeira de Pascoaes e Camilo Castelo-Branco (interpretados, respetivamente, por Ricardo Trêpa, Luís Miguel Cintra, Diogo Dória e Mário Barroso, todos atores celebrizados do cinema do cineasta) reúnem-se para debater, entre outros temas, os fracassos lusitanos, a criação artística e, principalmente, a veracidade das profecias da personagem icónica que dá o nome ao filme.

Ora, mas se é sobre Portugal e, talvez, a humanidade no seu todo, nem por isso deixa de ser sobre Oliveira e as várias difrações do seu trabalho com que veio associado, representado por cada uma das personagens presentes: os idealismos falhados, a poesia olvidada, o modernismo histórico incompreendido e o romantismo condenado. Vemos estes quatro símbolos máximos literários a debaterem entre si, mas sabemos que é Oliveira que nos olha de frente, assumindo-se como “o velho do restelo” à beira mar, gritando que continuamos a lutar contra moinhos de vento.

Inesperado (e o que nos faz querer aprofundar mais esta teoria) é o registo pouco comum do realizador com que fez esta curta-metragem: uma edição mais trabalhada, entrelaçando os diálogos com imagens de arquivo, reaproveitando excertos de O Quinto Império – Ontem Como Hoje e Non ou a Vã Glória de Mandar – dois trabalhos sobre a dor dos Descobrimentos para o país que pretendeu engradecer – Amor de Perdição e O Dia do Desespero – refletindo a necessidade da arte e os sacrifícios a que se submete o seu criador para se superar enquanto indivíduo comum, aproveitando-se, como tal da obra e últimos dias de Camilo Castelo-Branco.

No entanto, não deixa de se sentir incompleto e parte de um projeto maior que, devido à falta de energia no cineasta não veio a ser realizado, que é, infelizmente, a falha mais notória desta obra.

O melhor: A tese derrotista de Oliveira.
O pior: A curta duração e a sensação de que há mais para ser contado.


Duarte Mata

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