Quarta-feira, 24 Abril

«Campo de Flamingos sem Flamingos» por João Miranda

A piada de alguém que convida pessoas para ver as fotografias ou o filme das férias, convencido do interesse que o material tem e completamente alheio ao facto de sujeitar os outros a uma espécie de tortura, já é bastante antiga. Infelizmente é essa piada que parece descrever bem o filme de André Príncipe Campo de Flamingos sem Flamingos.

É um filme desconexo, aparentemente sem sentido e mesmo ler o que está escrito na página da produtora não parece ajudar: “Os cinco elementos Japoneses são, por ordem de importância – Terra, Água, Fogo, Vento e Vazio. Pessoas e animais estão lado a lado num jogo muito antigo. Há o dia e a noite. Tudo existe simultaneamente. Uma viagem pela fronteiras Portuguesas“. Há também um blog onde se pode encontrar uma Nota de intenções e um Pedido de Ajuda, onde se consegue perceber mais ou menos o que o realizador queria fazer, mas nunca porque poderia ele pensar que isto faria um bom filme.

Há uns tempos preocupava-me com a primazia do visual sobre a palavra no cinema atual, mas durante este filme tive uma revelação sobre o cinema português: mais do que estar a perder a palavra e a articulação verbal, não tem nada a dizer. Esconde-se em pretextos artísticos e na utilização do meio, mas na prática não tem nada a transmitir, nenhuma ideia a defender, nenhuma sensação a explorar. Mudo e apático, o cinema português parece ser um argumento de força para a teoria da não inscrição de José Gil.

Começo a perguntar-me sobre a viabilidade do cinema português: se da dúzia de filmes anuais que produzimos nenhum pensa no público, como poderá alguma vez sobreviver? Preocupa-me que estes exercícios académicos, filmes de férias, filmes para amigos e outras formas não-comerciais de cinema estejam a condenar o cinema português a ter de sobreviver de subsídios que estão a ser cortados, limitando a entrada de novos talentos e valores e fazendo com que o público nunca venha a reconhecer o valor do cinema português. Se houvesse uma base de público para o cinema português, seria possível co-existirem os vários tipos de cinema, mas se o único produzido é o que impede a criação dessa base, como poderá sobreviver o que quer que seja?

O Melhor: Há planos interessantes, no meio da confusão.
O Pior: Há uma personagem interessante que poderia justificar uma fita só para ele, mas que se dissipa na sobrecarga do filme.


João Miranda
(Crítica originalmente escrita em abril de 2013)

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