Sexta-feira, 26 Abril

«Horns» (Cornos) por Hugo Gomes

Alexandre Aja poderá ser constantemente relembrado pelo seu empenho em Haute Tension, a sua segunda obra realizada, mas o reconhecimento ficou-lhe aquém do devido. Agora vencido pela industrialização das refilmagens e trabalhos genéricos de estúdio, Aja vira-se para o best-seller de Joe Hill (filho do escritor Stephen King), transferindo assim um conto negro que alude ao próprio mito de Satanás (o anjo condenado por Deus a rastejar nas profundezas do submundo como castigo da sua traição) para o grande ecrã sob a forma de um filme ambíguo até à medula, mas que não foge à sua evangelização de mártir.

Daniel Radcliffe, o mundialmente conhecido Harry Potter, e ansioso por fugir a esse registo, interpreta um rapaz que após a morte misteriosa da sua namorada é acusado por tudo e por todos como o eventual homicida. Desesperado e sob um ato de revolta, renega toda a ajuda divina. Como castigo desta sua insurreição, o rapaz é amaldiçoado com o nascimento de “chifres” que despertem nos outros a sua pior natureza.

Emancipado da sua veia mais trash e despreocupada, Horns (Cornos) funciona como um utopia entre o bíblico e a mitologia do cinema de horror, nomeadamente a dos tempos atuais, aos quais é auferida uma preocupação a nível psicológico. Obviamente, este “filme chifrudo” não é nem será o melhor exemplo de ensaio psicológico, mas é como citar psicologia entre o simbolismo religioso, as referências do mal personificado impressos num thriller de narrativa dinâmica, ocasionalmente negro na sua glorificante forma. Radcliffe é pleno no seu desempenho e consegue transmitir uma tragédia de Prometheus nesta sua figura “crucificada”, conduzido o filme de Aja para os seus recantos desejados.

Contudo, Horns é uma daquelas obras que se tivesse um grupo, esse grupo seria a do desperdício através de uma única cena. Neste caso uma sequência que desperta o que de pedagogico e fervorosamente cristão possui. Assim, como peças dominó, esta fita acaba por desabar através de uma moralidade inquestionável e correta. Como luz a desferir a escuridão invocada, Aja cede ao familiar e termina bem sob os bons valores da religiosidade mencionada. Resultado? Um final decepcionante num trabalho cinematográfico que havia adquirido alguns trunfos. Poucas vezes o Inferno foi tão tentador!

O melhor – Daniel Radcliffe, os dois primeiros terços do filme
O pior – a moralidade cristã que cheira a bafio e a “pirosidade” no ultimo ato


Hugo Gomes

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