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A Grande Beleza: porque todos nós a perseguimos neste “doce vida”

Há algum tempo que não deparávamos com um filme tão abrangente a níveis artísticos e culturais como este La Grande Bellezza de Paolo Sorrentino, o mesmo homem que há anos esteve por trás de um quadro intimista sobre uma das enésimas páginas negras da história política italiana, Il Divo: A Vida Espectacular de Giulio Andreotti. Nesta sua nova obra, a mais pretensiosa até à data, o autor decide criar uma panóplia de “sabores” e de requinte visual, referenciando tudo e todos e preenchendo com todas as metáforas e dilemas que tem a seu alcance. Esta ambição que vai desde o visual, o técnico e o filosófico é ao mesmo tempo uma divagação pelas ruas e monumentos de Roma, captando a sua beleza e em busca da sua alma celestial.

Confusos? Pois bem, La Grande Bellezza é até complexo no seu modo operativo, ora é um retrato de pretensões para com a decadência de vida, sublinhando o lixo cultural e a pseudo-intelectualidade cada vez mais confundida com arte, ora é uma obra à deriva onde damos de caras com o nosso protagonista (Toni Servillo) vagueando como o derradeiro pedestre por uma cidade adormecida mas não morta na sua beleza inerente. É como de certa maneira Sorrentino invocasse cinema ocasional, filmando tudo como um guia turístico ou todos, o repentino cameo de Fanny Ardant parece ser prova disso, mas sobretudo o autor não deixa “morrer” o seu filme em maneira alguma. E quanto mais fundo o seguimos, mais nos deliciamos com a sua simplicidade, apenas envolvida por distorcidas e impenetráveis filosofias, morais e claro, um tom satírico e crítico que prevalece como ninguém.

Para além disso, Sorrentino é multifacetado na sua direção, quer pela mimetização (segundo as más línguas), onde consegue invocar Federico Fellini e o seu neo-realismo, como também a veia satírica de La Dolce Vita (a alienação da burguesia, por exemplo), até aos planos algo simétricos e renascentistas de Peter Greenaway. Ou seja, até na sua realização, Sorrentino incute a diversidade cultural, homenageando alguns dos novos artistas, aqueles desprezados pelos puristas das artes, que são os cineastas. Nisto tudo, sente-se em simultâneo uma mise-en-scene por vezes digna do teatro mais intimista.

Salienta-se ainda a banda sonora que parece abraçar o moderno com o clássico, de uma magnificência contagiante e o desempenho de Toni Servillo, o peão neste versátil jogo de metafisica que é La Grande Bellezza. Um filme de indescritível beleza, a vida de decadência cultural, a epopeia cultural de Sorrentino a captar a Itália no seu melhor. Por onde “caminhamos” quando morrermos?