Sexta-feira, 26 Abril

«Los Ilusos» por Bernardo Lopes

Se Antoine Doinel fosse espanhol, provavelmente o seu nome seria Francesco Carril. Rindo, chorando, bebendo, conversando, sonhando, vagueando pelas calles de Madrid ou simplesmente discutindo sobre cinema no Doré, este jovem cineasta de 29 anos que terminou recentemente a sua primeira longa-metragem cativa-nos com o seu inocente sentido de liberdade.

Com uma suave utilização do preto e branco, Los Ilusos transmite-nos a sensação de que o filme se encontra em permanente construção, ligando todas as camadas ao longo do seu desenvolvimento, para que seja apresentada ao espectador uma perspetiva sincera e crua acerca da essência do cinema.

Tendo afirmado que se tratava de um filme visivelmente imperfeito, Jónas Trueba acaba por mencionar o porquê de ser tão especial. Emocionalmente genuíno, estilisticamente avant-garde e visivelmente inspirado na Nouvelle Vague, recria uma realidade que está um pouco adormecida nos dias de hoje. O uso dessincronizado do som com a imagem produz momentos intensamente introspetivos que merecem ser referidos. Los Ilusos homenageia a sincera paixão que os cineastas têm pelo cinema: uma inconsciente e inocente vontade para fazer filmes. Tendo como referências conceptuais A Noite Americana (1973) e Os Quatrocentos Golpes (1959), dá-nos uma aprazível identidade de Madrid que nos era desconhecida da mesma forma que Truffaut nos deu da Paris dos anos 60.

Com um grupo de amigos e tempo livre, Trueba demorou sensivelmente um ano a concluir a sua segunda longa-metragem. Inovador na sua forma e conteúdo, acaba por se tornar num projeto peculiar devido ao seu plano de distribuição: uma única cópia que será projetada em pequenas salas de cinema, como art houses, o que justifica a sua pureza e capacidade de se ter tornado numa obra artisticamente fascinante.

Como resultado, Los Ilusos acaba por não ser simplesmente um filme: é também uma procura. Uma procura pelo porquê de se ser cineasta. O conhecimento e consciencialização ganhos com este filme têm um enorme valor que merece ser reconhecido. Cheio de referências cinematográficas e literárias, é não apenas uma simples homenagem à paixão pelo cinema, mas reflete também sobre os pequenos detalhes na vida que merecem ser filmados. Com este assombroso trabalho artístico, Trueba consegue por em movimento o seu discurso e pensamento.


Bernardo Lopes

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