Segundo a realizadora israelita Rama Burshtein, foram precisos cerca de 15 anos de estudo para conseguir concretizar A Noiva Prometida. A cineasta “penetrou” no seio do mundo algo secreto dos hassídicos, sociedade judaica ortodoxa que preservam a todo o custo o seu modo de vida tradicional, para invocar as suas memórias alusivas quanto aos romances de Jane Austen.
Sob uma câmara pertinentemente integrada mas nada intrusiva, Burshtein nos retrata a história de Shira (Hadas Yaron), uma jovem de 18 anos dividida entre o casamento “programado” pela sua família e o amor que sempre desejou, como motivo para encorajar uma visita aos bastidores de uma comunidade raramente apresentada ao público, um testemunho delicado limitadamente presente, mas acima de tudo um olhar interessado e dedicado.
Em A Noiva Prometida não existem julgamentos, panfletismo, nem sequer embelezamentos. O espectador entra e integra-se como família no leque de personagens bem substanciadas e na vasta sucessão de tradições ou da riqueza cultura que o filme acolhe e aceita. Quanto à trama propriamente dita, Rama Burshtein recria aqui um exercício de foro cultural ao mesmo tempo que tece um manto enigmático por esse enredo. As decisões difíceis que cursam uma vida, transfiguram uma juventude e a fidelidade à textura social que emerge são temas inerentes que A Noiva Prometida desempenha com tal precisão, mais do que simplesmente focar sobre casamentos “arranjados” que têm sido vistos como bizarria para os Direitos Humanos.
Porém, nota-se que em Rama Burshtein existe uma falta de frontalidade e subjugação fílmica, e sabe-se que não são essas as intenções da realizadora e muito menos de um espectador em vias de ser “entranhado” num ciclo de costumes longe dos habituais cânones quotidianos ocidentais. Apresentado no Festival de Veneza na edição de 2012, tendo arrecadado o prémio de Melhor Atriz (Hadas Yaron), A Noiva Prometida revela-nos uma experiência a não perder, uma espreitadela a um curioso mundo à parte.
Hugo Gomes
