Sexta-feira, 26 Abril

«Night Train to Lisbon» (Comboio Noturno para Lisboa) por Roni Nunes

Situação complicada a de Bille August ao mergulhar numa obra literária de difícil adaptação, repleta de considerações filosóficas e cujas motivações para as personagens não são fáceis de se abordar visualmente. Até porque pelo menos parte talento do cineasta, que já venceu duas Palmas de Ouro, parece ter ficado pela Croisette no seu último momento de glória (“As Melhores Intenções”, de 1990).

A começar pela ação que precipita todo o resto: não está nada claro que o professor de latim Raimund Gregorius (Jeremy Irons) ache a sua vida assim tão cinzenta para abandonar seus alunos na sala de aula e entrar num comboio com destino a Lisboa – tendo como única motivação um livro de um médico português que havia encontrado no bolso do casaco de uma mulher que salvou do suicídio. A partir daí o comboio de August vai entrar na difícil tarefa de encontrar no passado dos heróis da “resistência” portuguesa a magia para contrabalançar ao presente modorrento do professor. 

Mas, ao contrário de todas as expetativas, é aqui que ele consegue seus melhores resultados e termina por ser Jack Huston, uma boa surpresa, e não Jeremy Irons, a fazer o filme pender para o lado positivo na avaliação. Ele é o médico que escreveu o tal livro que trouxe o professor para Lisboa e é para reconstruir o seu passado que Gregorius perambula pelas ruas da cidade (belíssima, aliás). Aí ele vai encontrar todo o romance que lhe falta – de cunho político (a ação da resistência pouco antes do 25 de abril), afetivo (um triângulo amoroso repleto de passionalidade) e filosófico – já que, por fim, são as próprias ideias Amadeo do Prado que o fascinam.

Talvez pela proximidade com a sua própria história e cultura, esse olhar estrangeiro sobre Portugal deixa certas fragilidades evidentes ao olhar local – principalmente no que se refere a uma bastante questionável idealização de um movimento de resistência que tivesse logrado obter, de facto, uma revolução (embora movimentos de oposição obviamente existissem). Mas o mais desagradável, no fundo, é perceber a negligência de certas cenas, que beiram a palermice ou o quase amadorismo, inadmissível para alguém com o currículo do realizador. 

Apesar de tudo, o filme não falha totalmente em recriar com alguma vitalidade a história dos quatro jovens (além de Huston, as personagens vividas por Mélanie Laurent, August Diehl e Marco de Almeida) ligados pela opressão e pela resistência – contando com um bom elenco, bela fotografia e excelente banda sonora – para além das próprias conclusões filosóficas do livro do médico, narradas em off.

O Melhor: a fotografia, a banda sonora e Jack Huston
O Pior: algumas cenas e situações muito mal filmadas
 
 
 Roni Nunes
 

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