Quinta-feira, 25 Abril

«Tabu» por André Gonçalves

“Tabu”, terceira longa-metragem de Miguel Gomes (“A Cara Que Mereces”, “Aquele Querido Mês de agosto”) é um filme de duas metades, ambas a preto e branco. Na primeira metade, intitulada “Paraíso Perdido”, acompanhamos Pilar (Teresa Madruga), uma ativista que acompanha Aurora (Laura Soveral), uma idosa a atravessar uma grave depressão, que por vezes a leva a despejar algum ódio e desconfiança na sua empregada africana Santa (Isabel Cardoso). Na base desta depressão, um segredo, um amor proibido, marcado com “sangue nas mãos”, que irá ser explorado na segunda metade – intitulada apenas “Paraíso”, e a decorrer em plena África pré-Guerra Colonial. É aí que acompanhamos uma Aurora jovem (Ana Moreira) aventureira, casada, que comete o erro de se apaixonar por um outro homem (Carlotto Cota). 

A história que serve de base a este “Tabu” é de si “clássica” e sem grandes rasgos de criatividade. Mas é claramente na forma que Gomes se destaca de muitos (e que justificará o prémio atribuido no Festival de Berlim). E é sobretudo na segunda metade (sendo a primeira um filme mais português, tanto na localização como no registo global de diálogos, planos e tempos) que o filme imprime um cunho pessoal, ao apostar num cinema “mudo” feito apenas à base de “voiceover”, e ao transformar este dispositivo, tantas vezes vilipendiado (e muitas vezes, com toda a razão) em algo estimulante e profundamente adequado, sobretudo quando o filme a certa altura parece adotar um tom documental, de cinema que parece trazer pó na fita, e que aproveita ali nos minutos finais para reescrever um pouco a história também. Se Miguel Gomes peca nalgum ponto nas suas pretensões artísticas, é por um certo ato trágico final, mais difícil de engolir em termos lógicos. Mas podemos sempre desculpar a falta de lógica a um amor puro e incandescente, e claro, à intenção mais que óbvia em ligar facilmente vida e morte… 

Numa era marcada por um regresso ao passado, Miguel Gomes parece não ter escapado à chamada, e oferece aqui um filme que merecerá o falatório que tem sido alvo, em grande parte. 


O Melhor: O olhar de Miguel Gomes. 

O Pior: Haver um ou outro aspecto mais difícil de engolir, mesmo perante tanta beleza. 
 
 
 André Gonçalves
 

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