Quinta-feira, 25 Abril

«Albert Nobbs» por André Gonçalves

 

Nos anos 80, Glenn Close tornou-se uma das atrizes mais lendárias da indústria, e viu o seu esforço recompensado com cinco (!) nomeações aos Oscar só durante essa década (e na opinião deste crítico, Close deveria ter convertido pelo menos duas dessas nomeações em estatueta: uma por “Atração Fatal” , e outra por “Ligações Perigosas”, respetivamente a sua 4ª e 5ª nomeações).

Passando à frente no tempo uns 20 anos e picos, e eis que Close, com 64 anos, planeia o seu grande regresso ao grande ecrã, após ter sido obrigada a refugiar-se na televisão. O seu plano: transformar uma peça de teatro, que era por sua vez baseada num conto irlandês, na qual tinha participado em 1982, num filme. Glenn Close não só produz e representa, como é co-argumentista e autora da letra da música “Lay Your Head Down”, cantada por Sinead O’ Connor. Paixão assolapada por um projeto ou “não há maneira dos Oscars não me ignorarem este ano” – o espectador que escolha.

Close gastou 15 anos a tentar transformar esta peça em filme sem grande êxito. O filme esteve quase a entrar em produção em inícios da década passada, com o realizador Istvan Szabo a bordo, mas falhou o financiamento. Já em 2010, a produção foi adiada, e Mia Wasikowska e Aaron Johnson substituiram Amanda Seyfried e Orlando Bloom…

À partida, e por uma descrição muito simples da sinopse, justificar-se-ia o esforço de fazer este “Albert Nobbs”. Senão vejamos: temos aqui uma mulher (Close, claro) que é obrigada a passar-se por um homem – o Albert Nobbs do título – para arranjar trabalho e sobreviver na Irlanda do século XIX. Só com isto, e com o realizador Rodrigo Garcia na direção (autor do notável “Mães e Filhas”), esperava-se um retrato complexo que aborde questões de género e identitárias com ousadia, e tire minhocas da cabeça do cidadão comum. E quiçá faça uma distinção clara entre orientação sexual e identidade de género, se não for pedir muito. Isto para não falar numa potencial transformação física e psicológica de Close capaz de finalmente levar para casa o Oscar que tantas vezes lhe foi negado.

Infelizmente, “Albert Nobbs” é uma vergonha para o “cross dressing”, ou para qualquer questão de identidade de género. As suas boas intenções são completamente ofuscadas pelo tom ofensivo e muito ridículo do seu argumento, que perceberá mais de guarda-roupa, maquilhagem e tiques a usar que de qualquer substância que forme uma chamada “história”.

Rodrigo Garcia parece estar de mãos atadas aqui – este foi claramente desenhado como “O Espetáculo de Glenn Close”, e até aí o filme desilude um pouco, e quase que temos ali o seu foco invadido por Janet McTeer. O que dizer destas duas atrizes? Bem, temos aqui dois estilos de interpretação diferentes, sem dúvida, para duas personagens diferentes, mas igualmente opacas. No final de contas, dada a ausência de motivações concretas dada a Nobbs (que sai daqui quase um atrasado mental a pontos), talvez até simpatizemos mais com algum fulgor de McTeer vs. a performance estudada ao milímetro de Close. E não me ponham a falar daquele final…

As temporadas dos Oscar vão e vem; os filmes realmente bons atravessarão o tempo. “Albert Nobbs” será esquecido muito rapidamente (tirando para jogos de bebida, e outras questões “camp”/estatísticas relacionadas com prémios), independentemente das três nomeações ao Oscar que conquistou.

O Melhor: Close e McTeer, ainda assim.

O Pior: Aquele argumento sem pés nem cabeça. Que é como dizer com personagens feitos “clichés” ambulantes que não têm qualquer vida fora das linhas excruciantes que dizem.

 
André Gonçalves

 

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