Sexta-feira, 26 Abril

«Swans» por João Miranda

A tendência dos últimos anos no cinema independente e/ou alternativo de criar personagens alienadas antipáticas e de pô-las em situações constrangedoras, com comportamentos aberrantes a substituir respostas emocionais, tem escalado e tem atingido picos insuportáveis. Mais do que uma corrente cultural ou uma resposta a algo presente na cultura ocidental, esta tendência insere-se unicamente na história do cinema, uma reação ao desconstrucionismo e ao pósmodernismo, à morte da narrativa e à crescente ironia metacultural e metamediática, tão natural como uma criança frustrada com a não compreensão de um tema mais complexo se refugia na rejeição do mesmo e em comportamentos exagerados de negação.
É, de facto, uma resposta infantil a uma crise que o cinema ocidental enfrenta, após uma centena de anos de filmes, onde todos os temas parecem derivativos ou fragilmente emocionais. Mas há que apontar que o próprio Derrida, um dos grandes nomes do desconstrucionismo, nos seus últimos anos o reconheceu apenas como um passo ao qual se teria de seguir um maior, de reinscrição e afirmação da vontade. Proponho um regresso a Spinoza e a Nietzche, um pela sua posição anti-dualista que impregna a nossa cultura e permite que se chegue a extremos conceptuais que pouco ou nada têm a ver com a realidade, e o outro pelo seu conceito de Vontade, uma afirmação de vida, essencial e forte, para que, entre os dois, se faça uma nova teoria do cinema, sem a vergonha da narrativa inerente ao meio ou da emoção inerente à identificação com as personagens.
“Swans” é um destes filmes desagradáveis com personagens antipáticas e situações constragedoras. Tem tudo para se definir como um filme “alternativo”: nudez gratuita, um ladyboy, masturbação explícita e incesto. Nenhum destes elementos contribui para a narrativa, que é negada, rejeitando uma conclusão, evitando assim uma posição moral sobre o comportamento facilmente condenável das personagens. É, assim, mais um filme da já longa tendência infantil reacionária niilista, a negação da alienação distractora do meio. Poder-se-ia argumentar que há uma corrente anti-cinema nesta tendência, um movimento ambivalente de cuspir no prato que se come, um quase ódio ao meio e a tudo o que este permite, personificado na produção comercial norte-americana, produção essa que é, apesar de tudo, constantemente referenciada técnica e historicamente de forma fetichista, quase na esperança de a aura das obras referenciadas dar ao vazio da obra apresentada alguma profundidade. Só que isso não acontece, apenas se aliena mais o espectador, com a crítica a tecer elogios ao que se revela um exercício puramente masturbatório, com o qual este não se consegue identificar. É daí que vem o ódio à crítica e ao seu discurso.
O momento chegou para abandonarmos esta posição pósmoderna que não nos leva a lado nenhum. O movimento que se segue, por favor.

O Melhor: A técnica impecável, como sempre.
O Pior: Todos os clichés “alternativos” e a ausência de empatia.
 
 
 João Miranda
 

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