Quinta-feira, 25 Abril

«W.» por Lourenço Henriques

 

Bem ao estilo de Oliver Stone, W. desperta o espectador para o campo da polémica. Apesar das muitas derivações pela comédia, que aliás a personagem central proporciona frequentes vezes na vida real, o realizador mantém-se no seu habitat natural. É crítico, destemido, pertinente, ainda que ao mesmo tempo clemente no julgamento que faz das acções e atitudes do presidente americano.

Num filme contado entre a analepse e o tempo presente, Stone mostra-nos todos os conhecidos problemas do passado de George W. Bush. O alcoolismo, o diletantismo, a total falta de rumo até bastante tarde na vida, a reprovação paternal, todos males sarados a partir do momento em que o enfant terrible, vê a sua vida cruzar-se irreversivelmente com a mensagem de Cristo, iniciando-se assim o caminho rumo ao topo do mundo.

Ao mesmo tempo é-nos relatada a manobra que conduziu à declaração de guerra ao Iraque, com situações, umas verídicas, outras de veracidade questionável, em que o autor e o realizador se esforçam por demonstrar uma concertação entre Dick Cheney, Donald Rumsfeld e Condoleeza Rice, no sentido de empurrarem o presidente para a decisão que acabaria por tomar.

Nesta demanda, Oliver Stone absolve Colin Powell, a quem dá méritos de homem de grande envergadura, e George W. Bush, ao qual passa atestados de estupidez, ingenuidade, incompetência e leviandade, colocando-o como um cordeiro poderoso nas mãos de um maquiavélico Cheney. Deste modo, acaba por apresentar-nos um homem bom, que se julga uma espécie de justiceiro tocado pelo divino, rodeado de uma equipa que tira partido das suas fraquezas para alcançar objectivos de índole duvidosa.

Apesar de alguns pontos bastante positivos, dignos de destaque, o tom geral da fita é pouco entusiasmante. O risco corrido ao abordar temáticas tão recentes, com uma perspectiva realista, conduzirá inevitavelmente a que o espectador compare o que vê na tela com o que viu na verdade. Neste ponto, o elenco será talvez o principal prejudicado, dado que a colagem das interpretações às reais posturas e atitudes de figuras tão presentes atira os actores para um festival de imitações.

Contudo, ainda no capítulo do elenco, será de realçar que o trabalho de Josh Brolin, no papel de George W. Bush, impressiona pela semelhança alcançada. Os tiques, o sotaque, as expressões verbais e faciais, está tudo lá. Também por cima, como aliás é hábito, Richard Dreyfuss, com uma notável recriação de Dick Cheney, poderá, com toda a justiça, ser considerado o ponto mais alto de um filme pouco inspirado. Também de notar, James Cromwell e Ellen Burstyn, representando o casal George e Barbara Bush, têm desempenhos dignos da sua classe.

No campo da realização, não há uma grande marca pela diferença. A ideia central, de que o caminho que podia ter conduzido W. Bush a um lugar cimeiro na História acabou por conduzi-lo ao fracasso e ao isolamento, está bem conseguida, mas pouco mais. Destaque talvez para a cena em que George conhece a futura mulher Laura, interpretada por Elizabeth Banks. É um momento que transmite qualquer coisa mais.

Ainda de salientar, é a utilização da música, que cria algumas situações divertidas, tais como o sublinhar da atitude justiceira do presidente americano, através de uma comparação com Robin Hood, conseguida precisamente pela utilização oportuna do tema com o mesmo nome, que nos anos cinquenta do século passado, em Inglaterra, fez sucesso na série de televisão também com o mesmo nome, pela voz de Dick James.

Pelas performances de algumas pedras do elenco, bem como por alguns rasgos de bom gosto humorístico, este novíssimo capítulo da carreira de Oliver Stone merece uma vista de olhos. No entanto, pelo lado mais negativo, pela sua falta de incisão, por se abster de uma crítica mais directa, pela omissão de pontos fulcrais como a intervenção em que W. Bush se assumiu como “War President”, pela vontade clara de perdoar, desculpar e absolver o presidente americano de todas as suas asneiras, o filme pode facilmente desapontar o espectador. É pouco convincente.

 
 
 
Lourenço Henriques

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