Segunda-feira, 29 Abril

«The Hunt» (A Caça) por Diana Martins

Longe dos dias do “Manifesto Dogma 95”, do qual Thomas Vinterberg (juntamente com Lars Von Trier) foi fundador, e do seu maior sucesso, pelo qual nunca teve crédito ( uma das regras do Manifesto), “ The Festen” (1998), surge-nos um thriller psicológico sobre a confiança e a natureza humana, que ganhou respeito de todos e despertou atenções por todo o Mundo.
 
Um pouco em linha com o seu filme “The Festen”, que explorava o caso reprimido de pedofilia no interior de uma família, Vinterberg retoma o universo claustrofóbico que os indivíduos em comunidade podem moralmente desencadear. Em “ The Hunt” tudo é despoletado por uma declaração de Klara, uma menina de 5 anos, que falsamente acusa Lucas (Mads Mikkelsen), educador no infantário de uma pequena vila na Dinamarca, de pedofilia.
 
E todo o filme se desenrola no crescimento desta falsa declaração, que se espalha sem qualquer interrogação racional, que se entranha como se de uma verdade indiscutível – dogma- se tratasse, tal é a emocionalidade contida na natureza humana. A mentira, envolta no paradigma inocente de “ as crianças nunca mentem”, espalha-se como um vírus, deixando Lucas completamente encurralado na sua inocência e descrença de todos os amigos. 
 
Existe, contudo, sempre uma falsa calma durante a narrativa- ora nas árvores da floresta e no olhar tranquilo de um veado quase a morrer, ora nos silêncios contidos dos habitantes da vila – o que aumenta o clima de sombra e de tensão, encerrando-nos num ciclo onde somos os únicos a conhecer a verdade e sentir a injustiça que Lucas está a passar. É que a sua vida vai-se desmoronando dia após dia, até que nada mais sobra. Até que a sombra se instale e paire para sempre. O tom e o ritmo do filme colidem com a luz, ténue e sincera, sombria e melancólica. Porque é assim que se inicia a caça. Uma caça que tem um claro começo, mas nunca um fim.
 
Mikkelsen, um dos mais (re)conhecidos atores dinamarqueses da atualidade, ganha aqui o Prémio de Melhor Ator no Festival de Cannes, com o retrato perfeito de Lucas, algo charmoso e desajeitado, simultaneamente contido e revoltado.  
 
“A Caça” é assim uma obra cinematográfica singular, de uma sensibilidade contida extrema, onde as emoções se esgotam num sentimento de constrangimento e dor. Tão nórdico. Tão bom. 
 
O melhor: O tom e o ritmo, Mads Mikkelsen e a filmagem de Thomas Vinterberg.
O pior: A ideia já ser algo batida
 
 
 Diana Martins
 

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