Sexta-feira, 29 Março

Monstra 2019: as mulheres no centro da Triple X

 

Consideravelmente mais fraca e repetitiva que a seleção de curtas da sessão Triple X da Monstra 2018, a versão 2019 ainda assim manteve o espectador bem atento e quente durante a sua hora de duração, destacando-se objetos animados onde a mulher está no centro da narrativa, seja através do prazer, seja da dor e dos terríveis abusos.

Veja-se a primeira curta, Le Chapeau, que invadiu o ecrã com um traço negro em torno de uma mulher bailarina de cabaré, vítima de mil olhares masculinos e de uma clara objetificação sexual, isto enquanto simultaneamente se viaja também ao seu passado, no qual percebemos que foi abusada em criança. É um trabalho de 1999 de Michèle Cournoyer, simples no traço, complexo nas metamorfoses e anacronismos, infelizmente ainda “perfeito” para os tempos que correm.

De certa maneira semelhante no ambiente, mas mais colorida e trabalhada na forma de quadros em constante mutação sem viagens à dor do passado, temos Fifi Fatale (na imagem abaixo), trabalho de 2018 de Mária Kralovič que acompanha uma Femme Fatale que explora e cativa todos os olhares, mas que se prende a um que a levará a dissipar a sua essência. O melhor é mesmo não nos apaixonarmos…

A mesma dica dá Teat Beat Of Sex “Trouble”, da animadora letã Signe Baumane, que constrangida pela educação e pressão da mãe para não se masturbar, decide ter sexo, que leva ao casamento, à tristeza, e derradeiramente ao divórcio. Do mesmo grupo Teat Beat of Sex, tivemos mais três curtas (Teat Beat Of Sex “Respect, Teat Beat Of Sex “Graveyard”, Teat Beat Of Sex “Puzzle”), onde primam más relações, pressões matriacais e a eterna tentativa de submissão que o homem tenta em relação à mulher. No final do quarto filme da mesma “saga”, os risos foram progressivamente substituídos por alguns suspiros e um cerrar dos olhos de alguns na sala, que cederam ao cansaço e à repetição da fórmula em sketch e da mensagem. Ainda assim, fica a mensagem: “virgem, só o azeite”.

Na ponta final da sessão, o prazer feminino voltou a ter destaque com Le Clitoris, que já por aí andou em festivais nacionais e até fez sucesso em 2017 na Internet. É uma viagem ao obscurantismo a que o Clitóris foi submetido pela decisão dos homens, fossem eles da Igreja, os companheiros/parceiros de vida, ou até mesmo por Sigmund Freud, que impôs a tirania do orgasmo vaginal apenas pela penetração, relegando o clitóris para adereço que não merece carícia e empenho.


Le Clitoris

Já com o dedo português no traço e no corpo feminino, tivemos a curta Sentir-me, também uma viagem ao prazer entre o preto, o branco cores vivas a florescerem após o toque que conduz ao prazer. Um trabalho curioso de Débora Rodrigues, Joana Flauzino e Vanessa Santos que prima pela simplicidade de processos, mas que se revela eficaz.

Noutros registos menos centrados na mulher, mas com elas presentes, nem que seja para darem uma pancada num gato, viajamos até ao topo de um edifício para ver dois sofãs a esfarraparem-se todos enquanto têm sexo violento nas mais variadas posições. Este trabalho de PES, de 2002, valeu ao gato da dona dos sofás a culpa de os ter deixado assim. Mal ela imaginava o “Roof Sex” que se passou antes e que valeu a maior parte das gargalhadas da sala nesta sessão.

Finalmente, e pelo meio das curtas já mencionadas, tivemos ainda uma visita ao Carnaval dos Animais de Michaela Pavlátová (República Checa), um trabalho extremamente colorido que mistura várias técnicas de animação, que vão desde o desenho 2D, 3D, a marionetas, plasticina, areia e recortes. Foi premiada no Cinanima já no distante ano de 2016.


I am Sex

Houve ainda a Sobremesa de Anna Mastníková (2011), que mistura sexo, sedução, carnalidade, com comida, o ato de devorar e ser devorado; e I am Sex, trabalho de animação em que Yuval Haker explora o sexo, amor e ansiedade (com muitos palavrões pelo meio) na forma de um vídeo musical construído para o músico israelita Alon Eder.

Para o ano há mais Triple X.

Notícias