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James Caan: sobrevida para o herdeiro do Padrinho

 

Existe espaço para o cinema indie de língua inglesa no circuito parisiense, mesmo nestes dias de Rendez-vous Avec Le Cinèma Français. Enquanto as paredes do metro da Cidade Luz se põem a clamar por Le Mule (Correio de droga), o novo filme de Clint Eastwood, e a arcada dos complexos exibidores festejam Glass, de M. Night Shyamalan, uma pequenina comédia franco-belga falada com sotaques de Nova York faz muita gente chorar en français diante do regresso aos holofotes (e ao auge da forma) de um mito dos anos 1970: James Caan. Aos 78 anos, o eterno Sonny Corleone, o filho mais feroz de Marlon Brando em O Padrinho (1972), renasce das cinzas, após amargar décadas de ostracismos e papéis secundários ruins, como protagonista do comovente Holy Lands, lançado em França na quinta-feira passada.

Trata-se de uma reflexão sobre responsabilidade religiosa e parental, no universo judeu de Israel e de Nova York, filmada por uma escritora nascida na Europa e radicada nos EUA, Amanda Sthers. Ela saiu-se bem, anteriormente, na direção de longas-metragens, ao pilotar a comédia Madame (2017), com Rossy De Palma.

Em seu novo trabalho, Amanda põe Caan na pele de um cardiologista cansado da rotina que, após perder a fé e o amor da sua mulher (Rosanna Arquette, em grande atuação), decide virar um criador de porcos. Em França, plateias caem no pranto com a atuação dele, aplaudindo-o nas sessões ao fim da projeção, mesmo sem ele estar fisicamente lá. Tem até Patrick Bruel, ave canora popularíssima no Velho Mundo, brincando de atuar – e muito bem. O ótimo ator inglês Tom Hollander, o advogado dos Queen em Bohemian Rhapsody, vive o rabino que tenta amolecer o coração de Caan, cuja aposta numa criação de suínos soa ofensiva para os israelitas mais ortodoxos.

Ativo desde 1961, Caan marcou o seu nome nos ecrãs encarnando um tipo de galã bruto. Foi indicado ao Oscar pelo seu desempenho como Sonny, firmando com Francis Ford Coppola uma parceria que vinha de Chove no Meu Coração (1969). Os dois voltariam a trabalhar juntos em Jardins de Pedra (1987). Em 1975, Caan encheu cinemas, como o herói, no filme de culto Rollerball – Os gladiadores do século XXI, que faturou 30 milhões de dólares nas bilheterias – cifras impressionantes para a época.

Na década de 1970, a América tirou os olhos do próprio umbigo e foi aprender com a Europa o que era fazer um cinema preocupado com a condição humana, para revolucionar amarras políticas e morais. Nós, que atuamos naquela época, vivemos um período em que cada filme era uma tomada de posição ética, dos realizadores e da gente. Daí a força dos filmes da dita Nova Hollywood”, disse Caan, ao C7nema, numa das suas recentes (e quase invisíveis) passagens por Cannes, para divulgar o filme policial Laços de Sangue (2013), nunca lançado aqui.

No fim de 2019, Caan voltará aos cinema em Welcome to Pine Groove!, ao lado de Ellen Burstyn e Ann-Margret. Por enquanto, é uma obrigação cinéfila ver o seu desempenho como um sujeito amarrado à amargura, que se refugia em Nazaré, entre os animais, para evitar o contato com a família, rejeitando a orientação sexual do seu filho, um diretor teatral gay muito bem interpretado por Jonathan Rhys Meyers.