Sexta-feira, 19 Abril

«Labirinto»: será que ainda nos perdemos ao fim de 30 anos?

Anos 80, duas décadas antes das conversões para os grandes ecrãs da trilogia de Tolkien, O Senhor dos Anéis, e da saga Harry Potter, da autoria de J.K. Rowlings, assistíamos a uma expansão do género de fantasia nos cinemas e um dos responsáveis por essa “explosão” foi Jim Henson, o celebre “pai dos Marretas”. Porém, não tendo disponível a mesma tecnologia que dispomos nos dias de hoje, a criação desses mundos e das criaturas fantásticas que apenas existem na imaginação de cada um, eram limitadas na sua recriação por métodos tradicionais e alguns deles primordiais, Henson como manipulador e criador de marionetas ultrapassou essa dificuldade à sua maneira. 

Depois de ter transportado as suas criações (Os Marretas) para o grande ecrã em 1979 e de seguidas em outras aventuras cinematográficas, Jim Henson estreou-se no género com The Dark Crystal (1982), onde é visualizado um mundo magico completamente controlado por marionetas e com claras influências ao universo de Tolkien. Apesar de ter sido mal recebido nos cinemas norte-americanos, a fita, que por cá recebeu o título de O Cristal Encantado, tornou-se gradualmente num êxito em cinemas europeus e japoneses e num culto que ainda perdura. Passados quatro anos, o autor, que mesmo assim persiste, aposta em mais uma longa-metragem fora das suas criações de Os Marretas e Rua Sesamo, voltando-se de novo para a fantasia com Labyrinth (Labirinto), sob a produção de George Lucas. Contudo, desta vez a ação não é exclusiva para as suas marionetas. 

Labirinto remete-nos a uma adolescente de nome Sarah (uma jovem Jennifer Connely), obcecada pelos seus contos de fadas que numa noite é retida em casa para tomar conta do seu meio-irmão bebé, Toby. Revoltada com o facto, a jovem deseja que os “goblins” levem o seu meio-irmão para bem longe. Por magia, as ditas criaturas surgem, levando com é esperado, o bebé. Arrependida pelo seu acto egoísta, Sarah terá que atravessar um gigantesco e mágico labirinto num prazo de treze horas até chegar ao palácio do Rei Goblin (David Bowie), e enfrentá-lo, antes que o seu meio-irmão se converta também num “goblin” à mercê deste impiedoso monarca. 

Labirinto é de um esplendor técnico, mesmo que hoje seja considerado obsoleto na sua mesma. Os cenários são ricos, induzidos por influências a Lewis Carrol, Grimms e até L. Frank Baum, cujas mesmas marcas contagiaram o próprio enredo (argumento escrito por Terry Jones, um dos Monty Pythons). Jim Henson é um especialista nas suas marionetas, conseguindo assim transpor movimentos quase perfeitos destas suas criações no ecrã, como também em gerar personagens que não envergonham em nada o seu legado. Mesmo sob uma imaginação fértil e uma recriação fora do comum, “inocentemente” mágica portanto, Labirinto possui diversas falhas, e essas, são cada vez mais agravantes com o passar dos anos. É evidente que a fita de Henson envelheceu mal. Mas já lá vamos!

A interpretação de Jennifer Connely é demasiado “apagada“, por vezes forçada à sua pueril personagem. Todavia, a sua prestação tende em melhorar com o desenrolar da fita, assim como a composição da sua personagem, que acaba por adquirir alguma maturidade. Mas apesar disso, perde obviamente quando é confrontada com o “excêntrico” David Bowie. O ator / cantor faz de tudo para permanecer o vilão na ala “bowiana”. Um personagem distinto, de facto. Até porque a fita Labirinto parece ter sido concretizado envolto da sua figura flexível e aristocrata, e a relação que transpira sexualidade e o constante “flirt” para com a protagonista, uma combustão que expanda a narrativa deste enredo nada “labiríntico“. A banda sonora roda em torno do seu próprio ego como também da sua natureza musical, uma composição (da autoria de Trevor Jones) que nada tem de simbiótico com o espírito sugerido pelo filme, nem mesmo como acompanhante da história. Entre os títulos musicais, o main themeUnderground – sobrevive do leque como o mais atmosférico da trilha sonora, albergando essa aura “bowiana” logo no seu arranque.  

Labirinto pode muito bem funcionar como uma referência ao conto de fadas, mas tudo indica que Jim Henson esteve mais preocupado em vender o seu produto e compensar a má recepção atribuída a The Dark Crystal do que propriamente recriar um exercício de fantasia memorável e sólida. Com atributos técnicos invejáveis e raros nos dias de hoje (sobretudo com o facilitismo e a dependência do CGI e do chroma key), o filme funciona como uma ideia úbere, por vezes prejudicialmente imatura. Esse sufoco, evita uma ênfase trágica que o Labirinto parece nos levar a passos do seu desfecho. É uma obra do seu tempo, que nos dias que decorrem é quase difícil perder-nos nele. 

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