Sábado, 20 Abril

Migrações invadem os cinemas nacionais

Com a crise dos refugiados na Europa, as migrações estão no topo das discussões nas redes sociais e nos jornais. No cinema, aos poucos e poucos, vão-nos surgindo várias histórias sobre o tema. Só este mês, há três títulos a chegar às salas nacionais: Brooklyn acompanha o antes, o durante e o depois da migração; Umrika dá mais importância à razão que leva alguém a deixar o seu país sem que estejam envolvidas questões como a guerra, a fome, o desespero económico, a perseguição política ou simplesmente a ganância; já Mediterranea centra-se no depois da viagem para o outro lado – qual a receção que o imigrante tem no país onde encontrou um novo lar?

Começando por Brooklyn, este é um filme sobre a busca do sonho americano por parte de uma jovem irlandesa nos anos 50, que deixa para trás a família enquanto encontra do outro lado do Atlântico um novo amor e uma nova vida repleta de oportunidades.

Saoirse Ronan encarna Eilis, uma “miúda” que transita para um novo mundo à medida que vai descobrindo a intimidade da idade adulta, um período de grandes decisões e dilemas, relacionadas com o começo de uma nova vida e o abandono do que nos liga às nossas raízes familiares, mas também aos pequenos espaços e pessoas que marcam alguns pontos da nossa vida. A decisão de e Eilis entre Tony e Jim, Brooklyn e a Irlanda, é a pedra angular deste filme e a leitura da história varia consoante a perceção do leitor e a sua opinião sobre o próprio tema da emigração.

A América volta a ser representada enquanto destino de sonho em Umrika, ainda que as atenções estejam aqui mais voltadas para o choque civilizacional do encontro com o outro, partindo das suas representações culturais para traçar uma poderosa imagem das mitologias que acabam por condicionar a nossa visão do Mundo. Neste filme acompanhamos um jovem que vive numa pequena aldeia indiana no início dos anos 80 e que desde pequeno sonha com a Umrika (EUA), principalmente instigado pelos relatos que o seu irmão mais velho vai fazendo, por carta, à família.

Longe do cinema de Bollywood e da visão plastificada do postal turista para “gringo” ver, Umrika é uma pequena gema sobre a ilusão e ingenuidade que muitas vezes conduz à emigração, enquanto paralelamente mostra a dura realidade dos factos. É sobre a mitologia em torno da América e, mais em geral, de como as diferentes culturas se percecionam, quer seja pelo constante abuso dos estereótipos, incompreensões e rotulagens “exóticas”, típicas de todas as coisas desconhecidas. Prashant Nair , o realizador, usou mesmo na sua nota de intenções o exemplo de uma frase de Andy Warhol, que um dia afirmou que «toda a gente tem a sua própria América e todos os pedaços de uma América de fantasia que eles pensam existir mas que não conseguem ver».

Assim, e neste filme, os habitantes da pequena vila remota indiana criam todos uma ideia da América com base nas fotos e cartas que chegam até si. Ao fazer isso, eles formam as suas próprias interpretações e suposições sobre um lugar distante. Da mesma maneira que os ocidentais acham exóticos os templos hindus, as vestes, os turbantes sikh, ou os festivais de cor (Holi), na India acha-se exótico os americanos terem mulheres lutadoras, uma marmota que antevê a chegada da primavera, ou que ninguém no filme King Kong tente salvar o macaco em queda do Empire State Building. 

Por fim, em Mediterranea, acompanhamos a viagem de dois homens, Ayiva (Koudous Seihon) e Abas (Alassane Sy), que anseiam uma vida melhor para as suas famílias, deixando o Burkina Faso rumo a Itália. Baseado nas experiências de vida de Seihon, para Jonas Carpagiano, o realizador, a ideia nasceu logo após os primeiro primeiros motins raciais ocorridos em Itália, estávamos então em 2010.

Quando o conflito começou, este filho de uma afro-americana e um italiano, correu para Rosarno, Calábria, de maneira a compreender melhor a situação, procurando assim uma experiência em primeira mão, distante de um olhar mais sensacionalista. No início, a ideia era fazer uma curta-metragem sobre a revolta (A Chjana), mas, eventualmente, após conhecer Koudous Seihon (Ayiva), ficou convencido de que só fazendo uma longa metragem é que poderia lidar com os diferentes aspetos do incidente.

Nisto, o projeto cresceu de modo a perceber melhor a relação da Itália com os imigrantes. Em entrevista, Carpagiano comentava que apesar do cinema manifestar algum interesse em acompanhar e documentar as travessias dos emigrantes, raramente havia preocupação em perceber o que acontecia após a chegada ao país de acolhimento.

Por outro lado, o jovem cineasta quis também tocar na questão ambígua da compaixão ser muitas vez confundida com paternalismo, o que pode derivar da falta de conhecimento e acabar por provocar conflitos: «O imigrante não é apenas um forasteiro, o temido ou celebrado estranho, dependendo da ideologia de cada um, mas um tema cada vez mais importante num mundo global», afirmou, acrescentando numa outra entrevista que o seu objetivo com este filme nunca foi fazer algo excessivamente didático ou tentar mudar a política na Itália: «Para mim é suficiente se as pessoas pararem de olhar para isto como um grupo de migrantes e começarem a pensar neles como pessoas individuais.»

Brooklyn e Mediterranea já se encontram em exibição nos cinemas. Umrika estreia a 21 de janeiro.

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