Quinta-feira, 18 Abril

O dia em que tudo correu mal a Jean-Luc Godard

 

Há mais ou menos 32 anos atrás, mais precisamente no dia 10 de maio de 1985, o aclamado Jean-Luc Godard teve um dia para esquecer no Festival de Cannes.

Reza um artigo publicado no New York Times que o francês serviu de alvo a um atirador de tartes, que se autodenominava como George, “o mutilador de ícones“, ou simplesmente Georges Le Gloupier. Na realidade estávamos perante Noël Godin, o mesmo que anos antes tinha atirado uma tarte à cara de Marguerite Duras e que décadas depois ficaria ainda mais famoso por acertar em personalidades como Nicolas Sarkozy e Bill Gates. Quando questionado porque acertou em Godard, o  “profissional” confessou que  ‘Je vous salue, Marie (Eu vos saúdo, Maria), na altura o último filme do cineasta, era o responsável. Apesar de detido, Godard não apresentou queixa pelo ato e chegou mesmo a intervir a favor de Godin quando os responsáveis do festival ameaçaram bani-lo.

Porém, esse foi simplesmente o terceiro evento negativo do dia para Godard. Primeiro, os distribuidores italianos recusaram-se a retirar das salas Eu vos saúdo, Maria, isto depois do cineasta o pedir insistentemente. Seguidamente, e ainda, durante a manhã, num concorrido visionamento de imprensa do seu mais recente projeto, a audiência apupou Détective (Máfia em Paris), aumentando as criticas ao cineasta e aos seus último filmes.


Détective (Máfia em Paris)

Convém recordar que foi igualmente na 38ª edição do Festival de Cannes, em 1985, que nasceu igualmente um dos projetos mais criticados do grande nome da Nouvelle VagueKing Lear (1987). Foi no Croisette que Godard apresentou a ideia ao produtor Menahem Golan. Este, conhecido por projetos de segunda linha como a saga Gelado de Limão, O Vingador da Noite, A Noite das Facas Longas, Bolero e até Mata Hari, ficou entusiasmado com a ideia de trabalhar com um cineasta de renome, tendo sido mesmo assinado um contrato entre os dois nas costas de um guardanapo de papel. A sua única condição era que o argumento fosse de Norman Mailler, o qual ainda mostrou alguma resistência em trabalhar com um ego como o de Godard, acabando derradeiramente por aceitar. [anos mais tarde, Mailler disse que tinha sido uma das piores experiências da sua vida]

O resto é o que sabemos. O filme não vingou, mas ainda hoje se olha para ele com curiosidade, até porque no elenco encontramos Woody Allen, Leos Carax, Molly Ringwald, Julie Delpy, Burgess Meredith e até o próprio Godard no papel de um professor. Aliás, nem Godard foi muito simpático com o filme, tendo mesmo referido que não «entendia metade do que foi dito». Estas palavras, como aponta Robert Schanakenberg no seu curioso livro Secret Lives of Great Filmmakers, vieram a fazer com que Menahem Golan afirmasse que Godard «tinha cuspido no prato que comeu».

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